quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

parece dezembro, parece frio e não há mais cigarros. nem aqui em casa nem no bares nas bancas de jornais nas padarias. não há mais fome. e, se formos mais além, também não haverá mais cuidado nem zelo. somente o desmedido.
é dezembro, é frio. não há mais tristeza, não há caminhões nas ruas, não há ruas que te levem a outro lugar. logo não haverá rancor. mas sentirei falta de teus dentes, de algumas palavras, do gosto vivo do café. logo perderemos os guarda-chuvas, logo seremos ateus, logo-logo nos esqueceremos para não crermos no quanto fomos.

sábado, 1 de dezembro de 2007

Nota preliminar: Catarina tinha o poder de trazer o mar duas ondas pra cá da beira.

a intenção era ensiná-la a liturgia das horas, mas Catarina só entendia era o desajuste delas. ninguém havia lhe dito o quanto de desafeto as horas tinham pela vida, isso Catarina aprendera sozinha. para ela, as horas definiam-se como pedaços de eternidade que morrem. arquitetou extinguí-las, como se as horas representassem a contagem das dores, portanto dores sem medida, sem lugar no tempo, deixariam de haver. seria então, apenas o tempo, solto, que esse, Catarina sabia não haver meios de extingui-lo. desejou que Tadeu, antes que a consumisse, como o tempo consumia às horas, que Tadeu perdesse um pouco daquela sua humanidade tão dócil e comovente. apaziguou os conflitos íntimos, transformou-os em rupturas, compensou as dores que a remetiam ao instante anterior à consumação de Tadeu. e disse, com o rosto inexpressivo 'sou guardiã dos teus silêncios'. mas disse baixo, fazendo as palavras arrefecerem-se. Tadeu não pode ouvi-la. é que Tadeu não fazia questão de sabê-la. trouxe-a mais perto do peito. Catarina não demonstrava resistência, mas dentro de si, debatia-se por não saber evitá-lo. como evitar Tadeu, sua humanidade, a consumação prestes a acontecer? Catarina não sabia como evitar aquelas horas. e por isso, morria dentro do peito do Homem. morria para abreviar o tempo, ou, talvez, morria por não saber dizer ou calar ou o que quer que fosse a repeito de Tadeu.