Augusto me disse que sentia saudade do mar, em tom de confissão. Eu acatei seus braços e suas farsas sob o tapete espesso da cumplicidade inventada. Augusto era quem me dizia sobre as coisas como elas são. E eu cria como se crê na própria prece. Quando consultado, e somente nestas ocasiões, a respeito de meus escritos, Augusto emitia seu parecer: considerava-os traduções de uma dor estilística. Como se eu forjasse a dor que eu sentia, da qual ele jamais se apercebera, sob a forma de dor. Criticava a maneira com que eu dispunha as vírgulas e as observações acessórias. Era parte de mim a adjacência a Augusto, era eu inteira. Ou seria eu parte do que o adjazia?, assim como Caetano, o motorista, Dra. Helena, do escritório, os desabrigados aos quais dirigia caridades. Sereno e brando, melhor seria eu continuar sendo, fosse o que fosse, desde que ao alcance de Augusto. Então, eu o cercava desde cedo até o fim, entre café jornal gravata café toalha pijama, era eu a tecer-lhe o dia. Era eu a sofrer distância e a aliviar Augusto a salvo casa. Era eu entre agonizar Augusto em outro lugar que não aqui e a aflição de tê-lo entre as mãos e evasivo. Augusto sabia de um tudo. Explicava-me a gravitação dos astros, dos entornos, dos conformes. Augusto era conhecedor da quarta dimensão, que era o tempo; e da quinta, que era o pensamento. Também sabia a ciência dos átomos - resistência dos polímeros, mecânica dos fluidos, física quântica, radiação. Augusto farto em eloqüência. Desde sempre sabia Augusto. Até quando?, eu sigilosa me indagava. O dia morria lento entre meus lábios, enquanto tu, Augusto, ao meu lado deliravas em outras galáxias, enquanto dentro de mim te jorravas disperso, eu me sabia, tão lúcida, que obscena - artesã das horas a te orbitar.
Um comentário:
poxa, gostei tanto disso... tenho vários Augustos de vários subjetos para orbitar ao redor, fascíno-me por todos eles.
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